Vamos, vamos morrer.
Podemos morrer de velhos.
De costas para os mortos
ceifando nossas colheitas,
recolhendo no regaço a fruta,
sentar à beira-mar comendo
caça e pesca,
chupando lânguidos diospiros,
roendo raças de azeitonas,
mordendo o pão dos famintos,
com os pés de molho, vendo,
que chegou a hora de morrer.
Sai do abraço da fronteira,
faz-nos o enterro, carrega-nos.
Põe-te em teus terrenos pés lavradores,
vamos embora,
legar a encosta aos perdidos.
Não me deixes a encontrar-te
que eu só aprendi-me
e sei da minha saudade.
Não há identidade acima do nosso valor,
não tens idade,
podes morrer.
Vamos! Já! Vem em espumantes rebentações,
escorrendo do teu corpo de volúpia
pelos cabelos e seios de estátua,
navegar de mãos dadas pela água
tecendo as fibras do mesmo Fado das tuas núpcias.
Recolhe o teu berço e o teu amor,
içamos âncora e comemos as ondas,
na barcarola das tuas alvas edificações.
Esse fulgor da Justiça do Terreiro na proa
avista para lá do zénite dum Platão, Dante ou Antero.
Navega-nos para lá da tua costa-prisão,
espraia-te no espelho da cidade dos céus.
Tu, que levas a tua gente imersa no teu olhar,
rema-nos ao teu altar,
banha-te na bonança da morte que é enfim provar
do Quinto Império as tuas raízes de herói,
alma de pagão, homem ao Mar.
Portugal, salva-me, vamos morrer.
GJ